sábado, 28 de setembro de 2013

Embate entre culturas

Edward Burnett Tylor, em seu livro Primitive Culture (1871), foi o primeiro antropólogo a definir cultura de forma a acrescentar o caráter de aprendizado, opondo-se à ideia de aquisição inata, conforme segue a definição: “tomado em seu amplo sentido etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade” (TYLOR, p. 25). Ou seja, cultura está mais atrelada ao ambiente em que o homem está inserido do que ao seu legado genético.

Etnografia é o estudo aprofundado dos aspectos culturais específicos de um povoado, uma comunidade, uma tribo, enfim, o entendimento das nuances culturais de um determinado grupo de pessoas que vivem e compartilham uma determinada cultura. As demonstrações culturais podem ocorrer de três formas diferentes. A primeira forma é a endoculturação (ou enculturação) que trata-se do processo de aprendizado ou adaptação que uma pessoa passa com o objetivo de adequar-se a uma cultura. A segunda é a Socialização (ou internalização) que é quando os traços que caracterizam uma cultura internalizam-se em uma pessoa, ou seja, ela torna-se parte daquela cultura e passa a ser um modelo da mesma. E a terceira é a Aculturação que é quando duas culturas diferentes se influenciam e se inter relacionam.

Bem como qualquer forma de manifestação cultural, a aculturação é um tipo de processo que ocorre desde os primórdios da civilização humana quando, por exemplo, tribos de culturas diferentes entravam em conflito. Podemos citar outros exemplos clássicos de aculturação como o fenômeno helenístico, as cruzadas, as guerras, as dominações imperialistas, o período das grandes navegações e descobrimentos, o mercantilismo, as missões jesuíticas, entre outros.

Com a globalização e a evolução das tecnologias de comunicações, mais evidenciada pela internet, manifestações culturais de aculturação indiretamente tornaram-se mais corriqueiras do que antes, quando não havia tanta facilidade de comunicação e difusão de informações pelo mundo todo. Hoje, é normal nos comunicarmos com pessoas de diferentes nacionalidades, assistirmos a programas de TV do exterior, aprendermos sobre outras culturas através de filmes, documentários, cursos, palestras, tanto com objetivo profissional quanto pessoal. A comunicação e as informações fluem de maneira líquida e ininterrupta. Redes sociais interligam pessoas das mais variadas espécies através de interesses dos mais inimagináveis gêneros. Estamos na era da informação. No entanto, a liberdade atual decorrente desta evolução tecnológica pode causar problemas de etnocentrismo, quando uma cultura é tida como exemplar a ser seguida por outras, tornando essas cultural e ilusoriamente inferiores àquela.

A Antropologia, através da etnografia, defende o relativismo cultural, em que cada cultura deva ser repeitada e considerada como ideal no seu ponto de vista para o seu povo. Não existe cultura mais evoluída ou menos evoluída. A riqueza cultural de cada povo deve ser mantida através do enaltecimento de suas diferenças, características e particularidades.

Embora vivamos num país cuja cultura seja resultado de uma grande aculturação, com exemplos positivos e negativos de etnocentrismo, cada região desenvolveu sua própria cultura, mesmo que plural, e evoluiu à partir disto. Nossa pluralidade faz parte da nossa identidade cultural. Mesmo assim, temos exemplos de descendentes de emigrantes de outros países que respeitam e ensinam seus costumes ancestrais, geração após geração, com o objetivo de perpetuar suas culturas. Neste ponto, quando trata-se de relacionamentos inter culturais, podemos dizer que estamos bem acostumados e que temos vantagens em acolher e respeitar culturas alheias em relação à maioria dos outros países. Porém isto claramente não justifica as barbáries sofridas por civilizações indígenas devido a vários processos de aculturação e dominação arbitrários; e que ainda vem sofrendo (vide o caso Belo Monte), com perda de territórios, extermínio de civilizações e consequentes perdas culturais incalculáveis e irremediáveis. O impacto cultural sofrido por inúmeras civilizações ancestrais, não apenas no Brasil como em vários outros países como Austrália e México, em detrimento de dominações territoriais e interesses império capitalistas, foi tão devastador que não há parâmetros para calcularmos o tamanho do prejuízo cultural para as gerações atuais e do futuro, dada a enorme subjetividade da questão.

Alessandro de Cristo Moleta